Juventude e alienação

Repensar o papel educação na sociedade coloca a todos que aceitam esse desafio uma primeira reflexão: mas afinal, qual é o papel da educação na sociedade capitalista? No último texto publicado, denunciamos os inúmeros ataques que acontecem aos direitos da juventude e também a criminalização da juventude pobre, com as campanhas pela diminuição da maioridade penal. Para nós, compreender o papel da educação é também compreender a motivação desse discurso de que todo jovem pobre é um criminoso em potencial, pois são questões que estão diretamente conectadas.

Porque criminalizar a juventude? Isso pode causar estranhamento a muitos. Para responder isso, podemos usar uma citação do texto anterior: “como todos sabem a juventude é a maior força contestadora da sociedade vigente, seus modos de ser e agir entram diretamente em conflito com os padrões estabelecidos pelas gerações que as antecedem. A sua radicalidade, sua força transformadora, sua consciência critica, podem atacar diretamente a sociedade conservadora e os padrões da sociedade capitalista”.

Então, a criminalização da juventude busca por tirar a voz dos jovens, e colocar eles num estado de tranquilidade, tirar deles toda a rebeldia, as insatisfações, e gerar consensos. E é nessa perspectiva que aparece a educação, mas de uma forma bastante mais aprofundada. Aí surge a necessidade de compreender totalmente o papel que a educação cumpre no sistema capitalista.

Primeiramente, há uma ligação direta entre educação e trabalho, pois afinal, o estudo é um meio para se chegar ao trabalho. O estudo na escola pública te ensina o que é necessário para os trabalhos mais básicos, e quanto mais se estuda, melhor é o trabalho que se consegue. No entanto o trabalho é em si também um meio, mas um meio para “subir na vida”, ou seja, um meio para receber um salário melhor, e consequentemente para aumentar sua possibilidade de consumo. Então podemos dizer que o estudo, assim como o trabalho, é um meio para aumentar sua possibilidade de consumo. Este é o primeiro problema que vemos na educação capitalista, a sua função não é gerar conhecimento, e sim a mesma função de toda atividade humana neste sistema: gerar consumo.

A educação que é garantida pelo estado, a educação pública do ensino fundamental e médio, é onde estudam em grande parte os filhos da classe trabalhadora. Estas escolas em grande parte são sucateadas, e tem sérios problemas de infra-estrutura. Acreditamos que um espaço educacional público deve ter melhores condições para os trabalhadores e alunos que ali frequentam, no entanto para nós o problema do ensino público não é só o sucateamento, e não concordamos com uma a análise que se baseie somente nisso.

A escola pública cumpre um papel ideológico fundamental ao capitalismo. Nessas escolas é onde se ensina à juventude, ou podemos chama-los de futuros trabalhadores, a ideologia dominante. Lá, quando ainda são novos, é onde são criados os consensos ideológicos, com o ensino de conteúdos distantes e alheios aos jovens, onde estes não se enxergam naquilo que aprendem. Muitos jovens saem da escola sem compreender a sua história, a história do bairro e da cidade onde vivem, a organização política do estado regente, e, talvez o mais importante, sem ter uma análise critica. Após isso, estes entram no mercado de trabalho já anestesiados, o que diminui a possibilidade de questionarem sua situação e se revoltarem. Então, acreditamos que o ensino público é estratégico para o capital, pois é onde se forma trabalhadores obedientes, e para nós não há possibilidade de mudar esse quadro sem o fim desse sistema.

A escola pública é estratégica ao ponto de inclusive contribuir no processo de criminalização da rebeldia da juventude que foi citada nos primeiros parágrafos, e talvez da pior forma. Através do discurso criminalizador, jovens que fazem parte da mesma classe social, que são trabalhadores e/ou filhos de trabalhadores, perdem a identidade entre eles, pois alguns acreditam na educação que recebem, pois acham que aquilo pode melhorar sua condição de vida, mas existem outros que não acreditam. Estes outros são os que se rebelam, e que fazem ações que podem ser encaradas como desobediência, e em muitos casos a escola o criminaliza por isso. Devido a isso, estes jovens são vistos de formas totalmente diferentes pela sociedade, apesar de terem diversas semelhanças.

Então para nós a alienação da juventude começa na educação pública, no sentido de criar jovens que são somente reprodutores de conhecimento e que quando chegarem a idade adulta serão coniventes com a ideologia dominante que os oprime. Estes não conseguem perceber que eles são os que mais sofrem com as mazelas das desigualdades sociais geradas pelo capital, e também não enxergam que eles são donos de sua história e da história de seu classe, e que cabe a eles a transformação desse quadro.

Nós somos um coletivo de anti-capitalista. Somos educadores, mas não acreditamos na educação dentro dos parâmetros capitalistas. Defendemos que a única forma de melhorar a educação pública é através da uma revolução completa do sistema educacional. Defendemos que a única forma de termos uma educação de qualidade, com um ensino emancipador e crítico, e onde o seu fim será o conhecimento em si, é com o fim da escola capitalista. E por isso fazemos formações com jovens, dentro das escolas e fora delas, porque acreditamos na rebeldia dos jovens e no seu potencial transformador, e que podemos lutar juntos por uma nova sociedade.

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